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A Jornada da heroína e os ciclos de morte e vida

A Jornada da heroína e os ciclos de morte e vida

Em diversos contos de fadas, principalmente entre os mais famosos, as princesas caem em um sono semelhante a morte, como é o caso de Branca de Neve e a Bela Adormecida, por exemplo.

O tema do sono da morte é muito comum nas jornadas femininas e tem um significado bastante profundo para a compreensão da psique feminina e a sua jornada de individuação.

Conforme Von Franz (2010) o tema do sono que se assemelha a morte é encontrado na mitologia. No mito de Coré e Deméter, o deus Hades sequestra, movido por uma forte paixão, a bela Coré e essa passa pela morte simbólica e se torna a Rainha do submundo e do mundo dos mortos.

No mito de Eros e Psique, a heroína é perseguida por sua futura sogra, Afrodite, e cai no sono da morte após seu encontro com Perséfone.

Em Branca de Neve e Bela Adormecida, as madrastas perseguem as princesas movidas por ciúmes, vingança e inveja, assim como Afrodite persegue Psique que havia superado a deusa em beleza.

Em Bela Adormecida, a fada amaldiçoa a princesa pois foi esquecida e renegada,assim como Afrodite, que também estava sendo deixada de ser cultuada em função da beleza de Psique.

Conforme Von Franz (2010), a deusa não tolera uma rival humana. Isso significa que a psique feminina possui uma beleza que faz frente a deusa, ou seja, que faz frente ao arquétipo da Grande Mãe. Ao mesmo tempo, essa perseguição por inveja traz o desenvolvimento da psique feminina e do próprio arquétipo da Grande Mãe.

Esse arquétipo do grande feminino pode aparecer de diversas formas, como vemos na Mitologia e nos contos de fadas. As deusas, as fadas, as bruxas são aspectos de uma unidade feminina. E a mulher precisa conhecer e se relacionar com todos esses aspectos do feminino para encontrar a completude, incluindo o lado terrível,simbolizado pela bruxa. E esse lado terrível é justamente a morte.

Em termos psicológicos significa que o desenvolvimento da personalidade feminina passa por aspectos sombrios da Grande Mãe. São eles que impulsionam a heroína rumo ao seu processo de individuação.

O tema da perseguição da Mãe Terrível e da morte da donzela e virgem, Neumann (1995) conceitua como “A Morte e a Virgem”, e aponta como um fenômeno básico da psicologia feminina matriarcal.

O essencial na psicologia feminina refere-se à relação mãe e filha e a relação primordial de identificação entre elas.

Conforme Von Franz (2010) tanto a mãe, quanto filha tendem a projetar o Self feminino uma na outra. Enquanto a filha projeta aquilo que quer ser na mãe, a mãe projeta aquilo que poderia ter sido e suas qualidades e características não desenvolvidas.

Essa projeção pelo lado positivo traz segurança a mulher quanto a sua feminilidade e a vantagem de uma inteireza e completude naturais que os homens não possuem(Neumann, 2000).

No entanto, conforme aponta Von Franz (2010), se não é justo para a mulher copiar o homem, é igualmente ruim que ela seja por demais unilateralmente feminina, pois corre o risco de ficar à margem da vida e ser incapaz de enfrenta-la.

Por essa razão a identificação mãe e filha e o aspecto virginal e de donzela precisam morrer, para que a mulher possa desenvolver os aspectos masculinos positivos de sua psique.

É nesse momento, nessa urgência de desenvolvimento psíquico, que entra a figura da mãe terrível, que tenta destruir a psique feminina emergente, mas ao mesmo tempo a impulsiona ao encontro com a morte e com seu aspecto masculino.

Por isso, conhecer os ciclos de morte e vida é vital para o desenvolvimento psicológico da mulher.

No mito de Psique, e nos contos Branca de Neve e Bela Adormecida, o tema da morte da donzela ocupa a posição central, mesmo parecendo uma mera vingança do feminino.

Para a mulher moderna esse é um desenvolvimento crucial, pois, a relação com a mãe é a sua forma de se relacionar. É a primeira relação com a qual a mulher se espelha, por isso todas as vezes que houver a necessidade de um desenvolvimento psicológico e uma ampliação de consciência esse conflito com a figura da Grande Mãe retornará.

A relação com a mãe para a mulher é de igualdade, pela semelhança entre os sexos. Por isso, a mulher busca a igualdade em suas relações posteriores. Ela anseia – de forma inconsciente – por essa relação primal que conheceu na infância. O ser compreendida, ser semelhante, ser aceita como é, vem desse desejo infantil.

O que deve morrer então é esse desejo infantil, esse desejo de uma ligação de igualdade, principalmente com o masculino, pois o masculino se trata de uma instancia diferente.

Se esse desejo não morre, a mulher nunca irá conhecer o parceiro como ele é e também seu masculino interior. Essas imagens estarão sempre contaminadas pelo complexo materno.

Porém, paradoxalmente, essa morte se dá por uma espécie de fracasso.

No mito Eros e Psiquê, após cumprir todas as provas e mesmo sendo orientada pela torre, Psiquê abre a caixa com o creme de beleza imortal de Perséfone. Ao fazer isso, cai em um sono de semelhante a morte.

A princípio, parece que Psiquê fracassou. O mesmo acontece com Branca de Neve, que por três vezes sucumbe à bruxa má, mesmo sendo alertada pelos anões. Elas sucumbem a mãe terrível.

Psiquê e Branca de Neve passam por um processo de desenvolvimento de seus aspectos masculinos, para no final perder sua objetividade e bom senso conquistados a duras penas. No entanto, é esse fracasso que as levam à vitória.

Isso significa que por mais que a mulher desenvolva seus aspectos masculinos (e deve por sinal), ela nunca será semelhante ao homem.

Nos contos masculinos, o herói mata o dragão, a bruxa, ou qualquer figura malévola,pois ele precisa se afastar das garras regressivas da mãe. Por isso todo o homem, luta durante sua vida com essa figura interna, pois a relação com ela é uma relação de dessemelhança.

O fracasso aparente das heroínas, mostram que elas não são símbolos de uma psique masculina, mas feminina. A morte e a entrega à Grande Mãe terrível, como fracasso simbolizam que a mulher entra em um estágio do feminino que vai além da relação com a mãe pessoal. Ela irá sucumbir á mãe arquetípica, um modelo de feminino transpessoal, onde ela encontra a fonte de uma feminilidade despida de padrões culturais e de família.

Ela então, se diferencia como mulher e se diferencia do masculino, podendo chegar a uma relação (interna e externa), mais honesta e mais verdadeira.

Referências bibliográficas:

HARDING, E. Os Mistérios da Mulher. São Paulo, Paulus: 2007.

NEUMANN, E. O medo do feminino e outros ensaios sobre a psicologia feminina. São Paulo, Paulus: 2000.

NEUMANN, E. Amor e Psique – Uma interpretação psicológica do conto de Apuléio. São Paulo, Cultrix: 2017.

VON FRANZ, M. L. O feminino nos contos de fada. Vozes. São Paulo: 2010.

Fonte:  http://www.jungnapratica.com.br/

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