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Grandes Mulheres e Rainhas Africanas

Grandes Mulheres e Rainhas Africanas

Fonte: https://www.ufrgs.br/africanas/indice-alfabetico/

Nefertiti (século XIV a.C.)

Nefertiti (1350 AC) | Neues Museum
Fonte da imagem: Encyclopædia Britannica. Disponível em: https://www.britannica.com/biography/Nefertiti/images-videos. Acesso em: 14 de dez. de 2020.

Consorte real de Akhenaton, também conhecido como Amenófis IV (Amenhotep IV), que governou no período de 1352-1336 a.C. como décimo faraó da XVIII dinastia egípcia. Ela viveu com seu marido e suas seis filhas em Amarna, onde teve um importante papel na adoração da divindade solar conhecida como Aton.

Nefertiti teve seis filhas durante os dez anos de casamento, as 3 mais velhas (Meritaton, Meketaton e Ankhesenpaaton) nasceram em Tebas antes do fim do sétimo ano de reinado de seu marido, enquanto as três mais novas (Neferneferuaten, Neferneferure e Setenpere) em Armana.

Durante o seu governo, Akhenaton simplificou a religião politeísta do Egito ao abolir o culto ao panteão dos inúmeros deuses, concentrando a adoração em um único deus, Aton, representado pela luz do sol. Nefertiti teve um importante papel na nova religião. O templo tebano conhecido como Hwt-benben (lar da pedra de Benben), vinculado diretamente a ela, contém uma representação dela fazendo uma oferenda a Aton, com o auxílio de Meritaton.

Aton, o “pai e mãe” de todas as coisas criadas, combinava elementos masculinos e femininos. Ele era assexuado e andrógino, então não tinha uma esposa, o que era incomum.  Em geral as divindades egípcias eram visivelmente homens ou mulheres que se casavam e se reproduziam de modo convencional. Diferentemente, a nova divindade não tinha esposa divina nem filho para formar a tríade usual (deus, deusa, filho), o que retirava dela qualquer aproximação com a representação humana, tornando-a uma entidade abstrata.

Akhenaton encorajou Nefertiti a promover o elemento ausente do novo culto. Apesar dela não ostentar uma titulatura real própria, é muito provável que governasse conjuntamente ao marido. Como ela era celebrada pela condição de gêmea religiosa e complemento feminino da figura masculina do faraó, passou a compor junto com ele e a divindade uma tríade invertida semi-divina.

BIBLIOGRAFIA

ALDRED, C. Akhenaten, king of Egypt. Londres: Thames & Hudson, 1988.

ARNOLD, D. The royal women of Amarna: images of beauty from Ancient Egypt. New York: Metopolitan Museum of Art, 1996.

HARRIS, J. R. Nefertiti rediviva. Acta Orientalia, v. 35, p. 6-13, 1973. Disponível em: https://journals.uio.no/actaorientalia/article/view/5173/4518

TYLDESLEY, J. A. Nefertiti: Egypt’s sun queen. Londres: Penguin Books, 2005.

Tyldsley, Joyce. “Nefertiti”. In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (dir). Dictionary of African Biography. Oxford University Press, 2012, v. 4, p. 434-437.

Meritaton

Provável busto de Meritaton | © Musée du Louvre/C. Décamps
Fonte da imagem: Musée du Louvre. Disponível em: http://cartelen.louvre.fr/cartelen/visite?srv=car_not_frame&idNotice=14658. Acesso em: 22 de dez. de 2020.

Também identificada pelos nomes Meritaten, Merytaten ou Meryaten, viveu durante a 18ª dinastia faraônica. Foi a primeira das seis filhas de Nefertiti e do faraó Akhenaton. Seu nome é uma homenagem à divindade única cujo culto foi criado no reinado paterno, e significa “aquela que é amada de Aton”. Suas demais irmãs foram Meketaton, Ankhesenpaaton, Neferneferruaton Tasherif, Neferneferrure e Setepenre.

Ela nasceu provavelmente em Tebas, antes de Amenófis IV assumir o trono real, pois Meritaton aparece retratada ao lado de Nefertiti em relevos esculpidos no Hwt-Benben. Ela aparece em pinturas de diversos templos, túmulos e edifícios, inclusive em cenas oficiais, como as representadas no Palácio Maru-Aton em Amarna. Seu nome é mencionado em documentos diplomáticos da correspondência real, como em uma carta de Abimilki de Tiro.

Meritaton parece ter assumido a posição de esposa real, pois assim aparece ao lado do marido, o faraó Smenkhare – que reinou em 1335-1334 a.C., e pode ter servido como regente na parte final do reinado de Akhenaton. Segundo algumas interpretações, ela própria pode ter governado o Egito no período entre 1334-1332. Como sua imagem aparece na decoração do faustoso túmulo de Tutankhamon, certos(as) pesquisadores, como a arqueóloga Alaine Ziye, defendem a ideia de que ela poderia ter sido a mãe adotiva deste jovem governante.

BIBLIOGRAFIA

TYLDESLEY, Joyce. Chronicle of the queens of Egypt:  From early dynastic times to the death of Cleopatra. Londres: Thames & Hudson, 2006.

DODSON, Aidan; HILTON, Dyan. The complete royal families of ancient Egypt. Londres: Thames & Hudson, 2004.

CYRIL, Aldred. Akhenaten: king of Egypt, Londres: Thames and Hudson, 1991.

WEGNER, Joseph. The sunshade chapel of Meritaten from the House-of-Waenre of Akhenaten. Philadelphia: University of Pennsilvanya Museum of Archaeology and Anthropology, 2017.

Makedda (século X a.C.)

Representação cristã europeia da Rainha de Sabá (1402-05)
Fonte da imagem: Wikimedia Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:BlackSheba-Text.jpg. Acesso em: 14 de dez. de 2020.

Também referenciada em textos euro-cristãos como Rainha de Sabá, e em registros árabes como Bilqis.  No Novo Testamento, é mencionada como Rainha do Sul (Math 12:42;  Luc 11:31). Mesmo as origens do nome não muito certas, alguns pesquisadores acreditam que o nome Makedda derive do termo “Macedônia” enquanto outros conectam com o termo Candácia (rainha-mãe).

Ultimamente, todas as histórias sobre Makedda, mesmo com diferentes nomes, podem ser traçadas através da Bíblia dos Hebreus, com passagens quase idênticas em Reis 10:1-13 e Crônicas 9:1-12, onde a visita da Rainha de Sabá ao reino de Salomão em Israel é descrita. A rainha, tendo ouvido falar da grandeza de Salomão, é aconselhada a visitá-lo e presenteá-lo com temperos, ouro e pedras preciosas.

Na tradição etíope, Makedda é apresentada como uma rainha poderosa que, atraída pela sabedoria de Salomão, lhe rende visita. Antes de retornar o rei, por um ardil, vive com ela uma noite de amor, e quando ela retorna ao seu reino concebe um filho, Menelik, que é o fundador da dinastia real etíope. Os pormenores deste episódio lendário aparecem detalhadamente descritos em um texto do final do século XIV, redigido em geez, a escrita antiga abissínia que leva o nome Kebra Nagast (O livro da Glória dos Reis).

Já em outras tradições o encontro entre Salomão e a Rainha de Sabá é descrito de modo menos detalhado, e ela aparece como sedutora e insistente, a qual Salomão vence as investidas com sua superioridade. Na versão árabe, ela é descrita inclusive como demoníaca, com pernas de animal. Em todo caso, todas as histórias se preocupam com o status anômalo de uma mulher muito poderosa.

Entretanto, nem todas descrições são negativas. Algumas tradições a apontam como uma ancestral de um dos magos que visitam Jesus Cristo na manjedoura. A identidade nacional e racial de Makedda também é alvo de muitos debates e especulações, pois além da associação prévia com a Etiópia, ela também foi conectada ao Iêmen, Senegal, Núbia, Oriente Médio e Europa.

Lembrada em poemas, romances, musicais, e sobretudo no cinema, em 1959 ela foi retratada em um filme por Gina Lollobrigida, uma atriz branca, mas em dois filmes mais recentes (1995 e 1997) a personagem foi interpretada por Vivica Fox e Halle Berry, atrizes negras.

BIBLIOGRAFIA

BUDGE, Ernest A. Walis. The queen of Sheba and herr only son Menyelek. Londres: Oxford University Press, 1932.

KAPLAN, Stephen. “Makkeda”. In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (dir). Dictionary of African Biography. Oxford University Press, 2012, v. 4, p. 55-56.

LASSNER, Jacob. Demonizing the Queen of Sheba: boundaries of gender and culture in postbiblical judaism and medieval islam. Chicago: Univesity of Chicago Press, 1993.

MACEDO, José Rivair. A rainha de Sabá e os mitos cristãos da Etiópia. Revista da Semana da África na UFRGS, v. 4, p. 10-15,  2017: https://issuu.com/deds-ufrgs/docs/revista_montada-m__dia

PRICHARD, James Benneth (Ed). Salomon and Sheba. Londres: Phaidon, 1974.

Ahhotep I (1560–1530 a.C.)

Rosto no caixão de Ahhotep I | Foto: Hans Ollermann
Fonte da imagem: OLLERMANN, Hans. 20 de mai. de 2007. Flickr: Hans Ollermann. Disponível em: https://flic.kr/p/LGyRg. Acesso em: 11 de dez. de 2020.

Rainha do Egito, é uma das mais proeminentes líderes mulheres na história do Egito Antigo. Ela acumulou numerosos títulos que indicam o seu poder e status, sendo lembrada como a “Paz da Lua”. Era irmã e esposa de Seqenenre Tao II, que morreu em batalha contra os Hicsos durante a ocupação do Egito, e mãe de Kamose e Ahmose, que o sucederam, e de Ahmose-Nefertari, a rainha-consorte de Ahmose.

Alguns pesquisadores a consideram a primeira de muitas mulheres notáveis, poderosas e influentes do Novo Reino; outros atribuem a ela a fundação em linha matrilinear da 18ª dinastia; outros veem-na como a verdadeira fundadora do Novo Reino; e outros reconhecem o seu papel na consolidação e manutenção da unidade do reino durante o difícil período de guerra.

Enquanto os homens que a cercavam foram para o campo de batalha, ou eram impossibilitados de governar, coube a ela a administração efetiva da capital do reino, em Tebas, após a morte de Tao II e durante as guerras de resistência que se sucederam durante o governo de Kamose e Ahmose. Quando este último ascendeu ao trono tinha apenas dez anos de idade, o que o impedia de assumir todas as responsabilidades de governo sozinho. Foi ela quem atuou como regente durante os seis primeiros anos do governo dele. Uma inscrição na entrada da fortaleza núbia de Buhen indica os seus dois nomes, sugerindo que, de fato, houve uma co-regência. Outras evidências arqueológicas encontradas em Tell el-Daba e sobretudo em uma inscrição no Templo de Karnak confirmam  esta interpretação.

Sua importância era reconhecida não apenas no Egito, mas também na região do Mar Egeu e no Mediterrâneo, onde se sabia de seu papel na luta de libertação contra os Hicsos.  A ela foi atribuído o título de “Senhora das Costas de Haunebu”, e nos pendentes de ouro de seu sarcófago está a “Mosca Dourada”, distinção que ela recebeu como prova de sua bravura e coragem. Este prêmio honorífico era concedido somente a pessoas a quem se reconheciam feitos e proezas militares.

BIBLIOGRAFIA

JÁNOSI, Peter. The queens Ahhotep I & II and Egypt’s foreign relations. The Journal of Ancient Chronology Forum, v. 2, p. 99-105, 1992.

OCHWADA, Hannington. “Ahhotep”.  In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (dir). Dictionary of African Biography. Oxford University Press, 2012, v. 1, p. 119-120.

VANDERSLEYEN, ClaudeLes deux Ahhotep. Studien zur Altägyptischen Kultur, v. 8, p. 237–241, 1980.

Khamerernebty II (III milênio a.C.)

Khamerernebty II
Fonte da imagem: Giza Project at Harvard University. Disponível em: http://giza.fas.harvard.edu/objects/25316/full/. Acesso em: 22 de dez. de 2020.

Rainha durante a 4ª dinastia do Antigo Egito (2613-2494 a.C.), era filha do faraó Quéfren (Khafré) (2558-2532 a.C.) e de Khamerernebty I. Embora o assunto seja ainda discutido entre os especialistas, parece que ela foi casada com o seu irmão, Miquerinos (Menkauré) (2532-2503 a.c.). Seu filho foi o príncipe Khuenre.

Foi enterrada em uma tumba na necrópole em Gizé, no cemitério perto da pirâmide de Quéfren, originalmente projetada para sua mãe. Em uma das inscrições na entrada da capela pode-se ler seus atributos e distinções, como mãe e esposa dos faraós do Alto e do Baixo Egito, sacerdotisa de Thot (Djehuty) e reverenciadora dos deuses Hórus e Seth.

BIBLIOGRAFIA

BAUD, Michel. The tombs of Khamerernebty I and II at Giza. Göttinger Miszellen, nº 164, p. 7-14, 1998.

CALLENDER, Vivienne G.; JÁNOSI, Peter. The Tomb of queen Khamerernebty II at Giza. Mitteilungendes Deutschen Archäologischen Instituts, Cairo, v. 53, p. 1-22, 1997.

TYLDESLEY, Joyce. Chronicle of the queens of Egypt. Londres: Thames & Hudson, 2006.

Bartare (século III a.C.)

Bartare
Fonte da imagem: Dr Sophie Hay. 08 de nov. de 2018. Twitter: @pompei79. Disponível em: https://twitter.com/pompei79/status/1060564030753030144/photo/4. Acesso em: 21 de dez. de 2020.

Primeira governanta núbia de Meroé a exercer o poder político, teria governado no período situado entre 284-275 a.C. As informações sobre ela são muito imprecisas, e o pouco que se sabe é que teria recebido os títulos de “Filho de Rá, Senhor das duas Terras”, título que era utilizado apenas pelos faraós egípcios. Sua pirâmide encontra-se ao sul da cidade.

Bartare é tida como sucessora direta do soberano Arakakamani, o primeiro governante a ser enterrado em Méroe. Como governanta suprema, foi provavelmente a primeira das candácias, termo de origem meroítica, kn-ti-kylktke, que em grego se lê kandake e que equivale a “rainha-mãe” ou “filha de rei”. Mas a ela não era atribuído o título de gore, que pode ser associado a “chefe”. Este último título aparece associado apenas a quatro governantas posteriores: Amanirenas, Amanishaketo, Nawidemak e Maleqereabar.

BIBLIOGRAFIA

OLIVEIRA,  Fernanda Chamarelli de. Senhoras da Núbia: as candaces na cultura material em Kush (África, I AEC – I EC). Dissertação (Mestrado em História), Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019.

PHILLIPS, Jacke. Women in Ancient Nubia. In: BUDIN, Stephanie Lynn; TURFA, Jean Marcintosh. Women in Antiquity. Real Women across the Ancient World. Nova York: Routledge, 2016.

SWEETERMAN, David. Grandes mulheres da história africana. Lisboa: Nova Nórdica, 1988.

Nefertari (século XIII a.C.)

Nefertari
Fonte da imagem: Wikimedia Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/ File:Maler_der_Grabkammer_der_Nefertari_004.jpg. Acesso em: 14 de dez. de 2020.

Rainha consorte e favorita do faraó Ramsés II, terceiro soberano da décima nona dinastia egípcia. Teria nascido por volta de 1290 a.C. e morrido por volta de 1250 a.C. Seu nome significa “a mais bela” ou “a mais perfeita”, e o seu epíteto de “amada de Mut” – a deusa consorte de Amon de Tebas – sugere que ela pudesse ter nascido no Sul.

A data de seu casamento é imprecisa, visto que não foi registrada oficialmente, mas há evidências indiretas de escritos registrados nas paredes de templos de Ramsés que ambos já estariam casados antes dele assumir o poder. Provavelmente ela não era integrante das altas famílias. Segundo algumas interpretações, teria sido mãe de quatro filhos e duas filhas da linhagem real.

Nefertari foi enterrada no túmulo QV66 no Vale das Rainhas em Tebas. O túmulo foi descoberto em 1904 por uma missão arqueológica do Museu de Turim, dirigida pelo arqueólogo italiano Ernesto Schiaparelli. Sua tumba foi saqueada na antiguidade, muitos objetos foram encontrados quebrados, e por conta disso restaram poucos artefatos da história da rainha.

A área do túmulo que mais sofreu danos com os saques foram as paredes, pois apresentavam uma requintada e bela decoração. A má qualidade do calcário impossibilitou que trabalhadores antigos entrassem diretamente na rocha do túmulo. Ao contrário, foram forçados a revestir as paredes da tumba com uma espessa camada de gesso que primeiramente fora esculpida e depois pintada em cores vibrantes. Recentemente confirmou-se que partes das pernas encontradas na tumba teriam sido da rainha Nefertari.

BIBLIOGRAFIA

CORZO, M. A.; AFSHR, M. (Eds.). Art and eternity: the Nefertari wall paintings conservation project, 1986-1992. Los Angeles: Getty Conservation Institute, 1993.

TYLDESLEY, J. A chronicle of the queens of Egypt. Londres: Thames & Hudson, 2006.

TYLDESLEY, Joyce. “Nefertari”. In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (dir). Dictionary of African Biography. Oxford University Press, 2012, v. 4, p. 434.

Karimala

Reprodução de inscrição sobre Karimala
Fonte da imagem: DARNELL, John Coleman. Yale Egyptological Studies 7: The Inscription of Queen Katimala at Semna. EUA. Yale Egyptological Studies. 2006. p.108.

Também referenciada como Kadimalo ou Katimala, foi uma rainha identificada em uma inscrição feita no templo de Dedwen, em Semna, na altura da segunda catarata do Nilo. O nome poderia indicar uma origem líbia. Embora a datação do registro seja difícil de especificar, parece remontar ao período da 21ª ou 20ª dinastia faraônica, cerca de 1.000-750 a.C., quando Napata despontava como estado proeminente na fronteira sul do Egito.

Karimala é apresentada na inscrição com as características das “grandes esposas dos reis”. Na imagem, ela aparece com uma coroa de penas duplas, segurando nas mãos a insígnia real e portando uma túnica longa. À sua frente, à direita, e de pé, está a deusa Isis, para quem ela olha.

BIBLIOGRAFIA

BALDI, Marco. Isis in Kush, a nubian soul for an egyptian goddess. Journal of Intercultural and Interdisciplinary Archaeology, 2015. Disponível em: https://journals.ub.uni-heidelberg.de/index.php/jiia/article/download/29455/23124

DARNELL, John Coleman. Inscription of Queen Katimala Semma PB: textual evidence for the origins of the napatan state. Yale: Yale Egyptologica l Seminar, 2006.

Maatkare Mutemhat (século XI a.C.)

Ahmose-Nefertari (1570–1505 a.C.)

Ahmose-Nefertari | Neues Museum
Fonte da imagem: Wikimedia Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Queen_Ahmose-Nefertari_Neues_Museum_26042018_2.jpg. Acesso em: 23 de dez. de 2020.

Primeira rainha da 18ª dinastia, durante o Reino Novo. Era consorte real do faraó Ahmose I, com quem teve pelo menos três filhos. Um deles, que viria a governar com o nome de Amenhotep I, sucedeu o pai no trono. Entre os títulos que ostentava, estavam os de “Princesa hereditária”, “Muito graciosa”, “Muito elogiosa”, “Mãe de rei”, “Esposa de grande rei”, “Esposa de deus”.

Seu pai, Kamos, governou durante o período da invasão dos Hicsos, e pode ter perdido a vida em uma batalha. Foi durante o reinado de seu meio-irmão e esposo real que ela recebeu, ao que parece pela primeira vez na história do Egito, o título de “Esposa do deus Amon”, o que fez com que posteriormente ela viesse a ser divinizada e venerada. Nesta posição, ela se tornou beneficiária de todas as propriedades e riquezas do templo de Amon, passando a incumbir a ela a administração de tais bens. Para alguns, poderia ter sido a regente durante a menoridade de Amenhotep I.

Sua posição de poder e prestígio refletem-se nas grandiosas representações de Ahmose-Nefertari em Karnak. Ela parece ter morrido no quinto ou sexto ano de governo de Tutmés I, e pode ter sido enterrada em Dra Abu el-Naqa. Após a morte, foi deificada e cultuada em Tebas, como “Senhora do Céu” e “Senhora do Oeste”.

Nas representações de Ahmose-Nefertari, ela é retratada com pele negra, ou por vezes assume tons de azul. Argumenta-se que a cor de sua pele poderia ser indicativo de sua ascendência núbia, conforme sugestão do arqueólogo Flinders Petrie, em 1939, e conforme interpretação do pesquisador Martin Bernal em seu conhecido livro chamado Black Athena (Atenas Negra), de 1978. Para outros(as) pesquisadores(as), a cor sinalizaria o seu papel como deusa da ressurreição, já que o preto é a cor das terras férteis e úmidas encontrada nas margens do Nilo.

BIBLIOGRAFIA

ALAMEEN-SHAVERS, Antwanisha. Not a trophy wife: (re)interpreting the position held by queens of Kemet during the New Kingdom as a political seat. Journal of Black Studies, v.  49, n. 7, p.  647–671, 2018.

BRADBURY, Louise. Nefer’s Inscription: on the death date of queen Ahmose-Nefertary and the deed found pleasing to the king. Journal of the American Research Center in Egypt, v. 22, p. 73-95, 1985.

GITTON, Michel. Les divines epouses de la 18e dynastie. Paris: CNRS, 1984. Disponível em: https://www.persee.fr/doc/ista_0000-0000_1984_mon_306_1

Nasalsa (século VII a.C.)

Nasalsa | © The Trustees of the British Museum
Fonte da imagem: The British Museum. Disponível em: https://www.britishmuseum.org/collection/object/Y_EA55517. Acesso em: 14 de dez. de 2020.

Rainha de Kush, foi uma importante figura real do período de Napata, entre o século VII e o século III a.C., quando o antigo Kush, no atual Sudão, ganhou independência frente ao Egito faraônico. Nasalsa provavelmente viveu no final do século VII a.C., quando Napata, cidade localizada ao sul do rio Nilo, era a capital de de Kush. Provavelmente era filha de Atlanersa, esposa real de Senkamanisken e mãe dos soberanos Anlamani, Aspelta, e da rainha Maqiden.

É conhecida pelos quatro pilares reais que foram erguidos em templos em homenagem ao deus núbio Amon de Napata. Pelas inscrições do Pilar de Aspelta os historiadores supuseram que ela fosse a rainha-mãe, embora todos os nomes nessa inscrição tenham sidos rasurados – como se fosse para apagar a lembrança de Nasalsa.

Outra fonte importante de informações é a tumba-pirâmide de 11m² sob o cemitério real de Nuri. Ali se pode ver textos funerários marcados nas paredes de pedra na câmara B, com pequenas estatuetas funerárias conhecidas como “ushebtis” ou “shabti”,  potes de cerâmica e cartuxos com o nome de Nasalsa inscritos nos quatro cantos do lugar de sepultamento. A qualidade da pedra usada na construção das câmaras subterrâneas e o incomum privilégio de ter itens depositados em sua tumba são prova da importância da rainha.

BIBLIOGRAFIA

DAFA’LLA, Samia. Succession in the kingdom of Napata, 900-300 B.C. The International Journal of African Historical Studies, v. 26, n. 1, p. 167–174, 1995.

LOHWASSER, A.. Queenship in Kush: status, role and ideology of royal women. Journal of the American Research Center in Egypt, v. 38, p. 61-76, 2001.

LOHWASSER, A. Die königlichen frauen im antiken reich von Kush: 25 dynastie bis zur zeit des Nastasen. Wiesbaden: Harrassowitz, 2001.

REVEZ, Jean. “Nasalsa”. In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (dir). Dictionary of African Biography. Oxford University Press, 2012, v. 4, p. 395-396.

TOROK, Laszlo. Between two worlds: the frontier region between Ancient Nubia and Egypt, 3700 BC – AD 500. Leiden; Boston: Brill, 2009.

Kawit (século XXI a.C.)

Relevo retratando a rainha Kawit recebendo cuidados
Fonte da imagem: Flickr: Egypt Museum. 18 de jul. de 2019. Disponível em: https://flic.kr/p/2gBiFx6. Acesso em 23 de dez. de 2020.

Rainha consorte da 11ª dinastia, era uma das esposas do faraó Mentuhotep II, que reinou no período de 2061-2010 a.C. Os dados sobre sua existência encontram-se no túmulo e na pequena capela a ela dedicada na parte dos fundos do complexo funerário do faraó, em Deir el-Bahri, na margem oeste de Tebas.

O túmulo de Kawit foi construído junto com os de outras prováveis cinco esposas-reais: Ashayet, Henhenet, Kemsit, Sadeh e Mayet. Apenas ela e mais duas parecem ter ocupado a posição de rainhas, enquanto as demais parecem ter sido apenas sacerdotisas da deusa Hathor.

Kawit aparece nos monumentos funerários de Mentuhotep II por vezes associada a divindades, ou diante da rainha Kemsit. Ela ostenta o título de “Esposa amada do rei”, “Ornamento do rei” e “Sacerdotisa de Hathor”.

Em seu próprio sarcófago de pedra que se encontra no Museu Egípcio do Cairo, uma cena pouco usual chama a atenção dos(as) pesquisadores(as) e parece indicar que sua origem fosse núbia. No relevo, ela aparece sentada, segurando em uma das mãos uma vasilha e na outra um espelho, enquanto duas serviçais pessoais arrumam o seu cabelo e lhe servem bebida. O tamanho curto de seu penteado poderia, segundo alguns, sugerir que tivesse uma origem núbia.

BIBLIOGRAFIA

GRAJETZKI, Wolfram. Ancient egyptian queens: a hieroglyphic dictionary. Londres: Golden House Publications, 2005.

ARNOLD, Dieter. Relief of wives of Nebhepetre Mentuhotep II. In: Oppenheim, Adela et al (eds.). Ancient Egypt transformed. The Middle Kingdom. Nova Iorque: The Metropolitan Museum of Art, 2015.

Amenirdis II (século VII a.C)

Amenirdis II (dir.) e a deusa Hathor (esq.)
Fonte da imagem: Wikimedia Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Karnak_Chepenoupet_II_Amenirdis_II.jpg. Acesso em: 27 de dez. de 2020.

Princesa núbia da 25ª dinastia de governantes do Egito, sediados na cidade de Tebas, foi a filha de Taharqa. Ascendeu ao poder por volta de 670 a.C. e governou até 640 a.C. pela autoridade que lhe era conferida como “esposa de Amon”.

Seguindo uma antiga tradição núbia de sucessão, Amenirdis II tinha sido adotada por  Ankhshepenupet, sua tia,  e mesmo após a derrubada de Taharqa do trono ela permaneceu com autoridade no governo. Ela “adotou” como sua sucessora a Nitocris, que era filha de Psamético – governante que deu início à 26ª dinastia de governantes do Egito.

Dessa maneira, uma dinastia feminina paralela, mais ou menos exclusiva, frustrou as reivindicações dos rivais à autoridade de Tebas. As “esposas de Amon” eram pessoas que tinham sangue real, eram consideradas como uma “mãe superior divina” e detinham poder efetivo em Tebas. As mulheres detentoras desse título não podiam se casar com qualquer homem porque eram consideradas formalmente casadas com a poderosa divindade que era Amon.

BIBLIOGRAFIA

DODSON, Aidan. The problem of Amenirdis II and the heirs of the office of God’s Wife of Amun during the Twenty-sixth Dynasty. Journal of Egyptian Archaeology. v. 88, p. 179–186, 2012.

Amenirenas (século I a.C.)

Reprodução de relevo sobre Amenirenas
Fonte da imagem: Internet Archive. Disponível em: https://archive.org/stream/osirisegyptianre00budg/osirisegyptianre00budg#page/221/mode/1up. Acesso em: 11 de dez. de 2020.

Também referenciada como Ameniras e Amanerinas. Rainha-mãe de Meroé, detentora do título de Candácia. Seu nome pode constituir uma alusão à divindade suprema egípcia Amon Ra. Informações sobre ela são fornecidas por escritores romanos, e alguns sugeriram que ela poderia ser a Candácia mencionada na Bíblia, cujo eunuco foi convertido ao cristianismo e batizado pelo apóstolo Filipe

A existência de Amanirenas é documentada em algumas fontes epigráficas. Na estela Hamadab, descoberta pelo arqueólogo John Garstang em 1910, haveria segundo alguns intérpretes uma alusão ao confronto entre tropas romanas e cuxitas, com a celebração da vitória africana no conflito de 25-21 a.C.  No mesmo monumento ela é retratada ao lado do filho Akindad, que dividia com ela o governo, em frente às divindades Amon e Mut, enquanto na parte de baixo aparecem prisioneiros deitados de bruços, em posição de submissão, que poderiam ser soldados romanos. Neste e noutros lugares ela é referida pelo termo kore, a palavra meroítica para governante.

Duas outras inscrições em que seu nome é certificado são grafites no templo de Daga, na Baixa Núbia, e a estela de Teriteqas, seu marido, onde ela é referida somente como Kdke, isto é, Candácia, Rainha-mãe. Segundo parece, as inscrições de Hamadab poderiam fazer referência ao período em que governava com o filho, Akindad, enquanto as outras dizem respeito ao período em que era co-regente e rainha-mãe, junto com o seu cônjuge.

Sua descrição marcial tem sido interpretada como uma alusão aos conflitos bélicos do período. Estrabão informa que Gaius Petronius, prefeito romano do Egito, lançou um contra-ataque aos cuxitas que tinham invadido a região de Tebas e passaram a controlar cidades como Elefntina, Syene, e Philae durante o governo de Aelius Gaius.  Segundo ele, os cuxitas aproveitaram-se do deslocamento das tropas romanas para uma batalha na Arábia e “escravizaram os habitantes e derrubaram as estátuas de Caesar”. A seguir, as tropas de Gaius Petronius marcharam contra os “etíopes” da “viril Candácia de um olho só” e os derrotaram em Pselchis, atingindo Napata e fixando uma guarnição militar na fortaleza de Qsar Ibrim. A rainha cuxita teria então atacado a guarnição, reabrindo as hostilidades, mas não deixa entrever o resultado do embate.

As descrições deste controverso acontecimento foram feitas por escritores romanos, em relatos marcados pela parcialidade e desprezo pelos “etíopes”.  É de se supor que Teriteqas tenha liderado a marcha inicial contra o Egito Romano, morrendo em batalha, quando Amanirenas assumiu sozinha a liderança do governo, representando parcialmente o filho. Muito provavelmente as incursões de Gaius Petronius não tenham ido tão longe ao sul do Nilo, e o certo é que os romanos jamais conseguiram impor sua autoridade ao sul do Egito nem impor-lhes o pagamento de tributo, limitando-se a manter postos militares na fronteira.

Além de proteger a integridade territorial e a independência do estado meroítico, Amanirenas inaugurou um período de prosperidade econômica que encorajou o florescimento do comércio, de trocas e o intercâmbio intercultural entre a região da Núbia e o mundo Mediterrâneo. Seu nome está associado ao período áureo de Meroé, que persistiria até a metade do século IV d. C..

BIBLIOGRAFIA

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Hatshepsut (c. 1507-1458 a.C.)

Hatshepsut | The Metropolitan Museum of Art
Fonte da imagem: The Metropolitan Museum of Art. Disponível em: https://www.metmuseum.org/art/collection/search/ 544450. Acesso em: 23 de dez. de 2020.

Esposa real, regente e mulher-faraó do Antigo Egito. Nasceu na cidade de Tebas, filha do faraó Thutmés I e da rainha Ahmés e pertenceu à 18ª dinastia de governantes, durante o Novo Império ou Reino Novo. Governou no período situado entre 1479-1458 a.C.

Segundo parece, teria vinte e quatro anos quando o pai morreu. Seguindo os costumes em vigor na sociedade egípcia, pelo qual os membros da família real casavam-se entre si, era esposa de seu meio-irmão Thutmés II (1492-1497 a.C.), que sucedeu o pai no trono em um curto período de governo. Este teve como sucessor Thutmés III (1479-1425 a.C.), filho dele e de sua segunda esposa chamada Mutnofret. Como o sobrinho e enteado, ainda criança, não dispunha de condições para assumir as responsabilidades de governo, na qualidade de esposa real Hatshepsut assumiu o poder como regente. Temporariamente, coube a ele o papel de participar dos cultos às divindades.

Já no período de governo de Thutmés II, a rainha adotou o nome de Maatkare, colocando-se como soberana do Egito e adotando os atributos faraônicos, os títulos distintivos e os símbolos da monarquia. Colocando-se publicamente como filha de Amon-Rá, apoiou-se no parentesco divino a esse deus importante do panteão egípcio para fazer reconhecer o seu prestígio, dedicando-lhe monumentos e objetos votivos no Templo mortuário de Djeser Djeseru (“A maravilha das Maravilhas), no complexo monumental de Deil el-Baari, junto ao Vale dos Reis, dedicado aos deuses Amon, Anúbis e à deusa Hator.

No sétimo ano da regência, ela proclamou-se faraó, passando a governar em nome de Thutmés III e em seu próprio nome, numa co-regência com o sobrinho, até sua própria morte.  Ao que parece, para manter-se nessa nova condição ela contou com o apoio dos sacerdotes de Amon, que ao manterem-se fiéis a ela receberam contrapartidas e favores da governanta. Ela se dedicou à administração interna do reino e à produção de grandes construções, monumentos e obras de representação da ideologia faraônica. Data de seu reinado uma expedição ao reino de Punt, no litoral da atual Somália, idealizada como a “terra do incenso”, cuja viagem é retratada nos alto-relevos de Deir el-Baari.

Vista como uma das pessoas mais influentes na história egípcia, teve após a morte o seu corpo sepultado no Vale das Rainhas. Ao que parece, todavia, teve seu nome intencionalmente apagado da memória dinástica por Thutmés III. Este teria mandado derrubar suas estátuas e retirar as marcas de suas insígnias dos monumentos, algo aliás frequente na história egípcia antiga. Este viria a adotar outra linha de ação para infundir o seu nome na posteridade, fortalecendo a organização militar e dando início a uma série de campanhas na Líbia, Oriente Médio e Núbia – alargando a influência egípcia até a quarta catarata do Nilo.

BIBLIOGRAFIA

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SOUZA, Aline Fernandes de. A mulher-faraó: representações da rainha Hatshepsut como instrumento de legitimação (Egito Antigo, século XV a.C.). 2010. 173f. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós-Graduação em História, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2010. Disponível em: https://www.historia.uff.br/stricto/td/1368.pdf

 

Cleópatra VII Filópator (69-30 a.C.)

Cleópatra VII Filópator | Foto: Sergey Sosnovskiy
Fonte da imagem: Ancient Rome. Disponível em: http://ancientrome.ru/art/artworken/img.htm? id=7870. Acesso em: 13 de dez. de 2020.

Rainha do Egito, foi a última governante da dinastia ptolomaica. Esta dinastia tinha sido fundada pelo general Ptolomeu I Soter  após a morte de Alexandre, o Grande, em 323 a.C.

Pertencente ao universo cultural helênico, incorporaram ao longo do tempo elementos da antiga instituição faraônica: desde a segunda geração, a dinastia aderiu ao casamento entre irmão e irmã, baseada na sua crença de que os faraós o praticavam.

Pouco se sabe da infância de Cleópatra, mas na família real, ambos meninos e meninas eram educados e as mulheres podiam governar juntamente com suas contrapartes masculinas. Plutarco conta que Cleópatra foi a primeira dos ptolomaicos a aprender a língua egípcia e que ela falava um total de sete idiomas. Ela também teria aprendido matemática, astronomia, música, retórica e literatura gregas.

Em 51 a.C., quando Ptolomeu XII morreu, Cleópatra, então com dezoito anos, assumiu o trono, governando com seu irmão (ou mais provavelmente meio irmão) Ptolomeu XIII. Como Ptolomeu tinha apenas 10 anos de idade quando o governo deles começou, Cleópatra foi a parceira dominante na relação. Três conselheiros da corte real, Áquila, Teodoto e Potino, aproveitaram-se da situação e exerceram forte influência sobre o menino. Enquanto Cleópatra pendia para o lado dos romanos, que haviam ajudado seu pai a reconquistar o trono, os conselheiros e Ptolomeu XIII, sob influência deles, apoiavam um Egito mais independente.

Por volta de 48 a.C. Ptolomeu XIII e seus conselheiros conseguiram expulsar Cleópatra para além das fronteiras do Egito. Enquanto ela estava reunindo um exército na Síria para tentar reconquistar seu trono, a disputa política entre os líderes romanos Pompeu e Júlio César teve desdobramentos no Egito, e ela encontrou ocasião de recuperar sua posição trono, o que obteve valendo-se de sua capacidade de charme, sedução e influência pessoal. César também garantiu aos irmãos mais novos dela, Arsínoe IV e Ptolomeu XIV, o governo do Chipre, o qual Roma havia anexado.

As relações pessoais e afetivas entre Cleópatra e César, com quem teve um filho, Ptolomeu XV, ao qual ela chamou Cesário, ou Pequeno César (47 a.C.), e depois com Marco Antônio, o importante líder romano que se estabeleceu em sua corte e envolveu-se com ela. Isto a colocou em conflito com Otávio, o mais alto pretendente ao trono imperial, e levou a que um conflito diplomático, e depois militar, eclodisse em 31 a.C., no qual o Egito foi derrotado e anexado ao Império Romano.

A morte dela, por suicídio, assumiu dimensão trágica e veio a ser objeto de inúmeras representações teatrais, musicais e cinematográficas. Personagem fascinante e controversa, é lembrada como irresistível amante mas também como governanta astuta, que empregou seus vários talentos para preservar o Egito como um estado independente o máximo possível.

BIBLIOGRAFIA

CHAVEAU, Michael. Cleopatra: Beyond the Myth. Traduzido por David Lorton. Ithaca: Cornell University Press, 2002.

JONES, Prudence. “Cleopatra VII”. In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (dir). Dictionary of African Biography. Oxford University Press, 2012, v. 2,  p. 101-104.

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KLEINER, Diana E. E. Cleopatra and Rome. Cambridge: Belknap Press of Harvard University Press, 2005.

WALKER, Susan; HIGGS, Peter (eds). Cleopatra of Egypt: From History to Myth. Princeton: Princeton University Press, 2001.

Cleópatra Selene (40 – 05a.C.)

Cleópatra Selene | Foto: Charles Edwin Wilbour Fund
Fonte da imagem: Wikimedia Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/ File:WLA_brooklynmuseum_Head_of_a_Ptolemaic_Queen.jpg. Acesso em: 13 de dez. de 2020.

Rainha da Mauritânia, na época uma província romana da África, no período de 15-05 a.C. Pertencia a dinastia dos Ptolomeus, que governou o Egito no período situado entre os séculos IV e I a.C. Era filha da rainha do Egito Cleópatra VII e do triúnviro romano Marco Antônio. Um de seus nomes, Selene, significa “Lua”. Teve um irmão gêmeo chamado Alexandre Helio, cujo último nome significa “Sol”.

Pouco se sabe da sua infância, exceto que participou da cerimônia das Doações de Alexandria, em 34 a.C., quando foi declarada rainha da Cirenaica, e que foi levada para Roma junto aos seus irmãos após a derrocada do governo de sua mãe, em 30 a.C., sendo incorporada à família da viúva de Antônio, Otávia.

Ao atingir a idade matrimonial, foi casada com Juba II, filho do último rei da Numídia, Juba I, e ambos foram declarados governantes da Mauritânia. A mistura de elementos ptolomaicos e egípcios aparece na produção artística de seu período de governo. Em prédios públicos, o grego passou a ser o idioma oficial, e o casal mandou construir uma grande biblioteca real.

Selene foi importante para o aprimoramento erudito de Juba II ao prover seu acesso à cultura e tradição dos governantes Ptolomeus do Egito. Tiveram um filho, Ptolomeu, que herdou o reino após a morte de Juba, em 23 a.C.. Pode ter tido outros dois filhos, conforme especulações recentes. Ficou conhecida por diversos trabalhos artísticos, incluindo bustos, moedas e um prato de prata do tesouro de Boscoreale.

Morreu provavelmente no ano de 5 a.C., durante um eclipse lunar. Foi enterrada num mausoléu real construído em Tipasa para ela e para o marido, perto de Cesaréia, numa estrutura ainda visível hoje em dia.

BIBLIOGRAFIA

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Mônica (331-387 d.C.)

Mônica por Benozzo Gossoli (1464–65)
Fonte da imagem: Wikimedia Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Monica_of_Hippo_by_Gozzoli.jpg. Acesso em: 14 de dez. de 2020.

Santa cristã, mãe de Agostinho de Hipona, é a mulher africana mais famosa do seu século. Nascida provavelmente em Tagaste, atual Souk Ahras, na Argélia, morreu em Óstia, o porto de Roma.  Seu nome sugere que sua família era nativa da região e falava e trabalhava na tradição púnica deixada pelos cartagineses, mas sua família imediata era cristã e pertencia às classes altas da sociedade romana provincial.

Nos escritos de Agostinho sobre Monica,  notadamente no livro Confessiones (As Confissões), redigido entre os anos 397-400, em que ele descreve episódios de sua infância e juventude, antes de converter-se ao cristianismo,  Santa Mônica é retratada em na sua propriedade rural (vila) dos arredores de Milão durante o inverno que antecedeu seu batismo, como alguém com uma fé religiosa serena, amor paciente por seu filho e esperança para que ele obtivesse um aprofundamento religioso.

Agostinho atribuiu à persistência e exemplo dela o mérito de ter-lhe preparado para a vida espiritual. Ela foi santificada pela Igreja não por operar milagres ou pelo martírio, mas por ter sido responsável pela conversão do filho que viria a ser um dos principais pilares morais do cristianismo. Ela teria morrido aos cinquenta e seis anos, e seu túmulo encontra-se no interior da Basílica de Santo Agostinho, em Roma.

BIBLIOGRAFIA

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Sophoniba (século III a.C.)

Sophoniba | Giambattista Pittoni (séc. XVIII)
Fonte da imagem: Wikimedia Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Giambattista_Pittoni-Sophonisba.jpg. Acesso em: 15 de dez. de 2020.

Aristocrata cartaginense, era filha de Asdrúbal, o notável comandante cartaginês da Segunda Guerra Púnica. Seu nome também é dado como Sophonisba e Spnb’l (“Baal pronunciou julgamento”).  Hoje tudo o que se sabe sobre ela é o modo de sua morte, preservada em uma tragédia conhecida por Tito Lívio; outros relatos existentes são de Apiano e Dion Cassio.

Ela era educada, conhecia literatura e música, e ficou lembrada por seu grande charme. Chegou a ser noiva de Massinissa, o grande rei da Numídia, mas acabou se casando com Syphax, um importante chefe rebelde da Numídia. Quando ele e ela foram capturados pelos romanos em 203 a.C Massinissa tentou, em vão, resgatá-la, e então, para evitar um destino pior para ela enviou-lhe veneno que ela bebeu. Depois Sophoniba foi enterrada com um digno funeral real.

Este escasso relato parece ter excitado a imaginação grega e romana, pelo seu caráter dramático. A morte trágica de Sophoniba foi encenada em uma peça em 148 a.C., e lembrada nos textos dos autores romanos acima mencionados.

A morte de Sophoniba tornou-se comum na arte. O mais notável exemplo é uma pintura mural na Casa de Giuseppe II em Pompeia, datada do primeiro quartel do século I a.C., onde se vê mulher em trajes reais em um sofá segurando uma grande taça de metal enquanto outra personagem real olha por cima do ombro. Em tempos mais recentes, Sophoniba tem sido objeto de inúmeras representações artísticas em pintura, teatro e ópera.

BIBLIOGRAFIA

DOREY, T. A. Massinissa, Syphax, and Sophoniba. Proceedings of the African Classical Associations, v. 4, p.  1–2, 1961.

HORN, Hein Gunther; RUGER, Christoph B. (Eds.). Die numiderColônia: Reinhard-Verlag, 1979.

ROLLER, Duane W. “Sophoniba”. In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (dir). Dictionary of African Biography. Oxford University Press, 2012, v. 5, p.  441-442.

Shanakdakheto (130 a.C.)

Shanakdakheto | UNESCO
Fonte da imagem: UNESCO. Disponível em: http://www.unesco.org/culture/museum-for-dialogue/item/en/84/statue-of-queen-and-prince-of-meroe. Acesso em: 27 de dez. de 2020.

Rainha de Kush, governou Meroé após o governo consecutivo de quarenta reis cuxitas que se sucederam durante sete séculos. Seu governo foi um divisor de águas, abrindo um período de poderosas rainhas que governaram o antigo Vale do Nilo.

Ao contrário de seus antecessores e suas sucessoras, informações sobre ela podem ser obtidas em sua pirâmide, ao Norte do assentamento da cidade de Meroé, mas também no Templo F, na Ilha de Naga, no coração da “Ilha de Meroë” –  localizada entre os rios Nilo, Atbara e Nilo Azul -,  e o grupo de estátuas CG 684 (provavelmente originário de sua capela funerária) exibido no Nubian Museum of Aswan (Museu Núbio de Assuã). Sua iconografia segue um padrão distinto, o que permite tirar conclusões sobre as precondições de sua coroação e alguns detalhes de seu reinado.

O Templo erigido ao pé de Jebel Naqa e parcialmente destruído por um deslizamento de rochas é um santuário dedicado à tríade tebana (deuses Amon, Mut e Chonsu), bem como ao deus leão meroítico Apedemak e sua companheira Amesemi. Em todas as cenas, Shanakdakhete é seguida por um homem que, por sua posição, pode ser considerado de nível inferior, mas, mesmo assim, é alguém do círculo real e tem contato direto com os deuses. Neste mesmo monumento há outra cena notável: a passagem de um rei falecido para outra vida e deificado, incluído na procissão de deuses. Cartuchos inscritos em ambos os lados do santuário contêm o nome de Shanakdakhete em hieróglifos meroíticos, o que atesta o primeiro uso da língua local em forma escrita – que viria gradualmente a substituir os ideogramas egípcios.

As cenas representadas nas estátuas do grupo CG 684 mostram Shanakdakhete usando a coroa ornamentada acompanhada por um homem sem insígnia real, exceto por um diadema principesco que toca sua coroa em um gesto conhecido de vários monumentos, o que sugere sua legitimação. A figura masculina pode ser a representação de seu filho. Também são representados deuses, e na capela real uma governanta aparece em alto relevo junto da deusa Isis-Selket, sugerindo sua relação com a maternidade.

Chama atenção que ela não tenha escolhido para si um nome de governanta que contivesse Amani, em referência ao deus Amon (Amun), como a maioria dos(as) seus(uas) predecessores(as), e que tenha abandonado os títulos usados pelos(as) governantes egípcios. Embora isso reflita um passo significativo no processo de emancipação do domínio cultural egípcio, seu reinado é marcado por um aumento quantitativo de bens de luxo importados, demonstrando boas relações e comércio com o Egito ptolomaico contemporâneo.

Ao que tudo indica, foi a sua posição como rainha-mãe que lhe conferiu a legitimidade necessária para que aparecesse como a primeira governanta de Meroé. Isto pode sugerir que o filho dela era jovem demais para assumir o trono, e que ela governou em nome dele, como regente, tendo sempre que representá-lo em todos os monumentos, fixando na iconografia uma nova forma de legitimação. A presença da imagem de guerreiros de origem estrangeira na iconografia de sua capela mortuária pode ser uma referência aos contatos de Meroé com o Mediterrâneo.

Outro ponto que chama atenção é que o seu governo é datado mais ou menos na mesma época em que Cleópatra II Filometer Soteira se tornou a primeira mulher governanta do Egito ptolomaico, em 131 a.C. Para alguns, permanece sem resposta saber se autoridade de governo das mulheres de Meroé resultou da estrutura social núbia ou se foi influenciado pelo Egito daquela mesma época. O certo é que as rainhas meroíticas cumpriam as mesmas responsabilidades que os reis, embora a maioria delas exigisse uma contraparte masculina cuja presença parece ter sido requerida para sua legitimação.

BIBLIOGRAFIA

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Pheretime (c. 570-510 a.C.)

Ilustração de medalha de Pheretime (1815)
Fonte da imagem: Internet Archive. Disponível em: https://archive.org/details/CostumeancienetAfriFerr/page/256/mode/2up?q=Pheretime. Acesso em: 18 de jan. de 2021.

Rainha da cidade de Cyrene, fundada por gregos no norte da África, na atual Líbia, foi uma liderança influente. Sua origem é desconhecida e sua aparição nos registros data dos anos de 520. Acredita-se que tenha sido herdeira da dinastia Battiad, que governou Cyrene por algumas gerações. Ela se casou com Battos III, que governou a partir de 570 a.C., com quem teve um filho e uma filha.

Quando o filho, Arkesilau, foi expulso da cidade e procurou refúgio em Samos, onde procurou apoio militar para atacar Cyrene e recuperar o governo, Pheretime tentou o mesmo na cidade de Chipre. Porém, o rei Euelthon rejeitou sua proposta e ao invés de armas e exército deu a ela um tear, pois considerava este artefato mais apropriado a uma mulher. Arkesilau encontrou o apoio necessário junto aos Persas e conseguiu retornar a Cyrene, mas logo depois foi de novo derrubado. Coube então a Pheretime reivindicar os seus direitos, já que fazia parte do conselho da comunidade. Após diversas peripécias ela conseguiu que a sucessão no trono fosse garantida ao seu neto, Batos IV, mas ela teve que deixar a cidade e encontrou exílio no Egito.

As circunstâncias de seu falecimento não são muito precisas, mas acredita-se que tenha sido por envenenamento. Seu bisneto, o último parente de que se tem notícia, Arkesilau IV, ocupava o trono em 440 a.C.

Os dados de sua biografia foram registrados por Heródoto, e apresenta um exemplo de mulher poderosa em um contexto adverso ao espaço feminino.

BIBLIOGRAFIA

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Sitt al-Mulk (970–1023)

Mulher do Egito (1797)
Fonte da imagem: Los Angeles County Museum of Art. Disponível em: https://collections.lacma.org/node/208621. Acesso em: 20 de jan. de 2021.

Princesa da dinastia Fatímida, a dinastia xiita que governou o Egito durante os séculos X-XII. Nascida em al-Mansuriyya, era filha do príncipe Nizar Abu Mansur, que mais tarde se tornou o califa al-Aziz (“o poderoso, glorioso” em árabe), e de uma cristã cujo nome permanece no anonimato. Em 971, sua família transferiu-se para o Cairo, a nova capital da dinastia Fatímida.

Sitt al-Mulk foi criada em grande fausto.  O historiador egípcio al-Maqrizi registrou que ela tinha cerca de 4.000 escravas a seu serviço, mantidas em seu luxuoso palácio. Por sua alta posição na família real Fatímida ela foi proibida de casar, mas gozou de grande influência e poder na vida política da época, tendo desempenhado um papel fundamental na sucessão do califado, quando da morte de seu pai, e mais tarde de seu irmão.

Quando o seu pai faleceu em 996 ela tentou um malsucedido golpe para impedir que seu irmão, al-Hakim, de apenas onze anos, assumisse o califado, mas foi impedida pelo eunuco de seu irmão, Barjawan, que posteriormente assumiu o cargo de primeiro-ministro. Depois voltou a estabelecer uma relação de proximidade com o novo califa. Al-Hakim lhe concedeu terras e uma renda anual de 10.000 dinares. Quando Barjawan morreu ela recuperou sua influência e entrou em conflito com al-Hakim em 1013, e passou a disputar sua autoridade, sendo, entretanto, afastada da corte.

Al-Hakim foi assassinado alguns anos mais tarde, o que recolocou Sitt al-Mulk em posição de vantagem. Por esta razão, alguns cronistas da época a acusaram de envolvimento na morte do irmão, mas não há evidências de que ela tenha sido responsável pelo assassinato.

Como Sitt al-Mulk tinha sido parcialmente responsável pela criação do sobrinho, al-Zahir, ela garantiu que ele se tornasse califa e assumiu a direção do governo como regente, governando até sua maioridade, período em que ela reverteu muitas das restrições religiosas aprovadas por seu irmão, além de realizar uma reforma tributária e econômica no Egito.

BIBLIOGRAFIA

BAKER, Christine. “Sitt al-Mulk”. In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (dir). Dictionary of African Biography. Oxford University Press, 2012, v. 5, p. 404-405.

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DAFTARY, Farhad. The ism‘ilis: their history and doctrines. Cambridge: Cambridge University Press, 2007.

Nefruptah (século XIX a.C.)

Reprodução de relevo sobre Nefruptah
Fonte da imagem: Wikimedia Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Relief_Neferuptah_by_Khuner.png. Acesso em: 23 de dez. de 2020.

Também conhecida como Neferuptah ou Ptahneferu, foi a filha de Amenemhat III (c. 1860-c.1814), e ao que tudo indica nunca reinou. O nome significa, literalmente, “Beleza de Ptah”.  Foi irmã da rainha Sobeknefru, cujo nome significa “Beleza de Sobek”.

Foi a primeira integrante de uma família dinástica a ter o nome mencionado em inscrições, sem ter o título de “esposa real”.  Deve ter desfrutado de um status especial, ou que fosse cogitada para governar. Ela é descrita como estando entre as melhores, alguém de grande valor, filha dileta de seu amado rei.

Seu túmulo foi encontrado intacto em 1955, em Hawara, perto da pirâmide de seu pai. O corpo tinha sido dissolvido pela infiltração de água, mas as joias, três vasos e prata e outros objetos e elementos do equipamento funerário estão preservados. Um sarcófago de granito com inscrições em sua homenagem também foi encontrado na câmara funerária de Amenemhat III, mas não foi usado ou foi usado apenas temporariamente.

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HILL, Brandi D. A study of royal female power and political influence in Ancient Egypt: contextualizing Queenship in the Twelfth Dynasty. Swansea: Swansea University, 2019.

TYLDESLEY, Joyce. Chronicle of the queens of Egypt. Londres: Thames & Hudson, 2006.

Sobeknefru (século XIX a.C.)

Sobeknefru
Fonte da imagem: Wikimedia Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Statue_of_Sobekneferu_(Berlin_Egyptian_Museum_14475).jpg. Acesso em: 21 de dez. de 2020.

Também identificada pelo nome de Sobekneferu ou Neferusobek, que significa, literalmente “Beleza de Sobek”. Foi a sétima e última governante da 12ª dinastia e, ao que parece, a primeira mulher conhecida a governar como faraó, tendo adotado os títulos e insígnias tradicionais da monarquia faraônica. Foi por isto chamada de “Amada de Rá”, de “Senhora das duas terras”, de “Sobek a perfeita” e outros qualificativos distintivos.

Ela administrou diretamente o Egito no período de 1799-1795 a.C. Era filha do faraó Amenemhat III (c. 1860-c.1814) e meia-irmã de Amenemhat IV, com quem, seguindo o costume, foi casada. Como este último governante morreu sem deixar um herdeiro, ela assumiu o governo. Por não ter tido filhos, seu reinado sinalizou o fim de sua dinastia e o início da 13ª dinastia.

Sobekneferu poderia ter sido a responsável direta pela construção do complexo monumental do templo de Amenemhat III, em Hawara. Porém, poucos monumentos e representações iconográficas fazem referência a ela.

Ao que parece, um busto desaparecido durante a II Guerra Mundial que estava no acervo do Museu Egípcio de Berlim poderia constituir uma das raras representações dela, e alguns pequenos registros pictóricos podem ter sido feitos em sua memória. Outra peça importante é o “Dorso de Sobekneferu”, pertence ao Museu do Louvre, na França. Ao todo, restam cinco imagens dela, embora o seu nome e o seu governo constem nas mais conhecidas listas reais. Nem o seu túmulo e nem a sua pirâmide foram até o momento descobertos.

BIBLIOGRAFIA

DODSON, Aidan;  Dyan Hilton. The complete royal families of Ancient Egypt. Londres: Thames & Hudson, 2004.

GRAJERZKI, W. The Middle Kingdom of Ancient Egypt: history, archaeology and society. Londres: Duckworth, 2006.

HILL, Brandi D. A study of royal female power and political influence in Ancient Egypt: contextualizing queenship in the twelfth dynasty. Doctoral thesis, Swansea University, 2019. Disponível em: http://cronfa.swan.ac.uk/Record/cronfa51920

Amanishaketo (41–12 a.C.?)

Amanishakheto | Museu Staatliches Ägyptischer Kunst
Fonte da imagem: Wikimedia Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Relief_Amanishakheto_Munich.JPG. Acesso em: 21 de dez. de 2020.

Também referenciada como Amanishakto e Amanishakete. Governou Meroé durante ou logo após a transição do domínio ptolemaico para o romano no Egito. Assim, poderiam ter sido suas forças que atacaram a guarnição romana em Assuã no período de governo do imperador Augusto.

Como a cronologia meroítica é muito imprecisa e as inscrições ainda não foram completamente decifradas, ela ou Amenirenas poderia ter sido a candácia mencionada por Estrabão que firmou um tratado para definir a fronteira romana-núbia em Maharraka, e poderia ter sido ela a governanta núbia no fracassado contra-ataque meroítico em Qasr Ibrim.

É muito provável que o seu palácio real de 670 metros quadrados estivesse localizado em Naga, dispondo de alojamentos, sala com várias colunas, diversos corredores e tesouros. Também foram encontradas duas estelas em sua homenagem em Wadi Ben Naga. Amanishkheto demonstrou grande reverência às divindades egípcias Ísis e Amon.

Outro traço marcante da história dessa rainha é o seu túmulo, reencontrado em 1830-1834 pelo médico e caçador de tesouros Giuseppe Ferlini, que impressiona pela quantidade de jóias e ornamentos de ouro, objetos de vidro, prata ou pedras preciosas, e também por conter duas flautas talhadas em estilo helenístico. Este tesouro funerário, após ter sido apropriado e levado pelo italiano, que tentou vendê-lo na Europa, foi parcialmente comprado em 1844 por Ludwig I, rei da Bavária, passando a fazer parte de seu antiquário real e do Museu Egípcio em Berlim.

BIBLIOGRAFIA

FANTUSATI, Eugenio. Amanishaketo”. In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (dir). Dictionary of African Biography. Oxford University Press, 2012, v. 1, p. 196-197.

ONDERKA, Pavel. Preliminary report on the third excavation season of the archaeological expedition to Wad Ben Naga. Annals of the Náprstek Muzeum, v. 33, p. 117-134, 2012.

WILDUNG, Dietrich. The treasure of Amanishakheto. New York: Smithsonian Libraries African Art Index Project, 1997.

Amanitore (século I a.C – século I d.C.)

Amanitore | Foto: Sandra Steiß
Fonte da imagem: Staatliche Museen zu Berlin. Disponível em: http://www.smb-digital.de/eMuseumPlus?service=direct/1/ResultLightboxView/result.t2.collection_lightbox. $TspTitleLink.link&sp=10&sp=Scollection&sp=SfieldValue&sp=0&sp=0&sp=3&sp=Slightbox_3x4&sp=0&sp=Sdetail&sp=0&sp=F&sp=T&sp=0. Acesso em: 11 de dez. de 2020.

Rainha-mãe de Meroé, coroada com o nome de Merkare. Compartilhou o governo com o marido, Natakamani.

Devido a ausência de registros escritos sobre o seu governo, parte do que se sabe sobre ela provém de evidências arqueológicas, que a apresentam como guerreira – por exemplo, no pilar do Templo do Leão, em Naga. Ali ela aparece retratada como uma mulher volumosa, com anca proeminente, fustigando inimigos enquanto estes imploram pela vida.

Os altos-relevos de Naga mostram imagens em perfeita simetria de dois co-regentes, o que confirma o compartilhamento do poder entre Amanitore e seu marido Natakamani. Ambos aparecem em tamanho equivalente, ele associado ao sul e ela associada ao norte, assim como as divindades são divididas por sua identidade sexual de acordo com as posições norte/sul. Também do lado oeste do templo, cada um dos membros do casal aparece flanqueando uma representação incomum de Apedemak, o deus-leão, que contém mais duas cabeças laterais e quatro braços laterais, que podiam ser dirigidos indistintamente ao soberano e à soberana.

Outro aspecto único de Amanitore é que ela sempre compartilhou com o rei o exercício das funções religiosas: isso pode ser deduzido a partir da observação do Templo de Amon (N.100) – construído em Naga pelo casal real. Neste templo, ela e Natakamani, vestidos em peles de pantera, aparecem realizando os ofícios sacerdotais e oferendas.

As escavações que começaram em 1995 dentro do templo N.300 levaram à descoberta de uma estela fragmentada na qual se pode ver os dedos de uma deusa, talvez Amesemi, noiva de Apedemak, que era provavelmente associada com a imagem da rainha meroítica. Na inscrição, é provável que a palavra “Amni” corresponda ao nome de Amanitore. Algo similar ocorre com a rainha Manishaketo, que aparece retratada em uma estela de arenito encontrada em um salão do Templo de Amonto abraçada com a deusa Amesemin – que usa uma coroa encimada por um falcão e uma lua, como evidência da divina benevolência da deusa à governanta.

Como em geral ocorria, Amanitore tem uma pirâmide no cemitério situado ao norte de Meroé. Os relevos nas paredes da capela representam uma procissão funerária de sacerdotes carregando várias insígnias e imagens daquela candácia.  No túmulo situado na parte inferior do edifício o seu corpo não foi encontrado, mas apenas restos humanos e ossos de animais.

BIBLIOGRAFIA

DUNHAM, D. The west and south cementeries at Meroe. Royal Cementeries of Kush. Boston: Museum of Fine Arts, 1963.

FANTUSATI, Eugenio. “Amanitore”. In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (dir). Dictionary of African Biography. Oxford University Press, 2012, v. 1,  p. 197-198.

OLIVEIRA, Fernanda Chamarelli de. Senhoras da Núbia: as candaces na cultura material em Kush (África, I AEC – I EC). Dissertação (Mestrado em História), Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019.

TORÖK, Lászlo. The kingdom of Kush. Handbook of the napatan-meroitic civilization. Londres: Brill,1997.

Arawelo

Nas tradições orais da Somália, Arawelo ou Araweelo é a governanta mítica de um reino em que a sucessão se fazia através das mulheres. Herdou o trono da mãe, Haramaanyo, e junto com duas irmãs liderou exércitos e venceu adversários homens, mandando executá-los ou castrá-los. Para as mulheres, ela é um símbolo positivo de empoderamento feminino. Ela chegou ao poder por volta de 15 DC.

Para os homens, onde é lembrada pelo nome de Moroombe, ela aparece como uma tirana gorda e feia, porém brilhante, sábia, astuta, que costumava propor adivinhas aos homens, mandando executar ou castrar aqueles que não soubessem resolvê-los. Assim, o seu reino é descrito nos contos como um espaço exclusivo de mulheres, uma sociedade matriarcal.

O mito de Moroombe explica a existência, na Somália, de muitos montes de pedra chamados de howaaltiir ou taallotirrivaad (monumentos dos pilares), que evocam sua memória. Quando os homens passam por algum deles, jogam pedras para amaldiçoar a governanta mítica, e as mulheres colocam galhos verdes e folhas frescas como sinal de respeito a ela.

BIBLIOGRAFIA

HANGHE, Ahmed Artan.  Folktales of Somalia. Uppsala; Somali Academy of Science and Arts 1988.

 

Maatkare Mutemhat (século XI a.C.)

Caixão de Maatkare Mutemhat
Fonte da imagem: Center for Egyptological Studies of the Russian Academy of Sciences. 17 de jan. 2017. Flickr: CESRAS. Disponível em: https://flic.kr/p/4Jfn71. Acesso em: 27 de dez. 2020.

Filha do sumo sacerdote de Amon Pinedjem I, que por volta de 1070 a.C. era o governamente de fato do Alto Egito e se proclamou faraó com o nome de Neferquerés I (Neferkare Amenemnisu) (1051-1047 a.C.). Sua mãe era Duathathor Henuttawy, filha de Ramsés XI, o último governante da 20ª dinastia. Outra mulher conhecida pelo nome de Maatkare viria a ser esposa de Osorkon I, da 22ª dinastia.

Maatkare recebeu o título de “adoradora divina”, sendo ritualmente entregue como  a esposa de Deus de Amon durante o reinado de seu pai. Veio a ser a primeira de uma série de governantas que herdaram essa função e esse título, que ela própria transmitiu à sua sobrinha,  Henuttawy D, filha de seu irmão, o Sumo Sacerdote de Amon Menqueperré (Menkheperre).

Várias de suas representações são conhecidas: ela foi retratada como uma jovem no templo de Luxor, junto com suas irmãs Henuttawy e Mutnedjmet.  Também aparece como alta sacerdotisa na fachada de um  templo em Karnak. Embora o local de seu sepultamento permaneça desconhecido, sua múmia foi encontrada em Deir el-Bahri em 1881,  junto com o seu sarcófago e outros de sua família.

BIBLIOGRAFIA

AYAD, Mariam. God’s wife, god’s servant: the god’s wife of Amun (ca.740–525 BC). New York: Routledge, 2009.

GRAHAM, Lloyd D. King’s daughter, god’s wife: the princess as high priestess in Mesopotamia and Egypt, 2017:

https://www.academia.edu/34248896/King_s_Daughter_God_s_Wife_The_Princess_as_High_Priest ess_in_Mesopotamia_Ur_ca._2300-1100_BCE_and_Egypt_Thebes_ca._1550-525_BCE_

Abar (século VII a.C.)

Reprodução de baixo relevo em Abu Simbel, Egito
Fonte da imagem: Lepsius-Projekt Sachsen-Anhalt. Disponível em: http:// edoc3.bibliothek.uni-halle.de/lepsius/ tafelwa5.html. ABTHEILUNG V, BAND X AETHIOPIEN, Seite 7 von 75. Acesso em: 11 de dez. de 2020.

Rainha de Kush, mãe de Taharqa, que governou de 690 a 664 a.C., durante o período da dominação Kushita no Egito. Por vezes é referida com os nomes de Abala, Abale, Abalo, Abiru e Ibart.

As principais fontes sobre ela são várias estelas encontradas durante escavações em Gematen, sítio localizado nas proximidades da atual comunidade de Kawa, ao sul da terceira catarata do Nilo, um dos maiores santuários de Kush. A imagem esculpida em relevo em uma das estelas retrata a rainha Abar em duas cenas simétricas, atrás de Taharqa tocando o instrumento musical conhecido como sistrum enquanto ele oferece pão e vinho ao Deus Amon. Representações similares foram encontradas em um relevo de parede no Templo B300 em Jebel Barkal, o principal complexo de templos da Núbia Antiga, situado entre a terceira e quarta cataratas, e no Templo de Amon em Sanam – próximo a Barkal, na margem oposta do Nilo.

Acredita-se que Abar era sobrinha pelo lado materno de Alara, fundador da 25ª dinastia e semi-lendário governante do Reino cuxita. Também tem sido considerado que ela era filha de Kashta, o primeiro rei cuxita comprovado, e irmã-esposa do rei Piankhy, o conquistador do Egito e primeiro dos faraós da Dinastia “núbia”.

As referências a Abar nas estelas tratam da visita dela à Taharqa, episódio comparado ao reencontro da deusa Ísis com seu filho Hórus. É provável que a “reunião” do rei com sua mãe foi realizada como uma confirmação de seu direito de sucessão ao trono. Pela maneira como são representadas, fica sugerido que a ascensão de Taharqa ao governo foi predeterminada por uma velha petição de Alara que, talvez, para celebrar sua vitória sobre rivais tinha “prometido” várias de suas irmãs ao Deus Amon de Gematen. Neste caso, fica bem estabelecido que a relação, através de Abar, com seu glorioso ancestral Alara, foi o mais importante argumento da legitimação de Taharqa. O precedente de Abar é particularmente importante como a mais antiga das evidências a respeito da instituição das rainhas-mães na vida política de Kush.

BIBLIOGRAFIA

LOHWASSE Rhwasser, A. Queenship in Kush: status, role and ideology of royal women. Journal of the American Research Center in Egypt, v. 38, p. 61-76, 2001.

TROY, L. Patterns of queenship in ancient Egyptian myth and history. Uppsala: Almquist and Wiksell, 1986.

VINOGRADOV, A. K.. “Abar”.  In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (dir). Dictionary of African Biography. Oxford University Press, 2012, v. 1, p. 04-05.

Nzinga Mbandi (1583–1663)

Rainha Nzinga Mbandi com sua comitiva militar (1622)
Fonte da imagem: Slavery Images. Disponível em: http://www.slaveryimages.org/s/slaveryimages/item/2284. Acesso em: 18 de jan. de 2021.

Também referida popularmente como Rainha Jinga ou Rainha Ginga, ou como Dona Ana de Souza pelos portugueses. Nome pelo qual é conhecida Nzinga Mbandi Kia Mbandi, soberana dos reinos de Dongo e Matamba, de 1623 até o fim da vida,  no território da atual Angola.  Filha do Ngola Mbandi Kiluanji, em 1617 disputou o trono do Ndongo com seu irmão mais jovem ou” meio-irmão”, o qual, vencendo a disputa, foi entronizado com o nome Ngola Mbandi.

Em 1622 ela foi enviada a Luanda para negociar um tratado de paz com o governador português João Correia de Souza, permanecendo lá por cerca de um ano, tempo em que inclusive, recebeu os sacramentos do batismo católico e o nome cristão de Ana de Souza. Após seu regresso ao Dongo, com a morte de Ngola ela assumiu o trono, que ocupou por cinco anos, descumprindo não só o tratado assinado com os portugueses como o pacto cristão do batismo mas também bloqueando as rotas de comércio que levavam a Luanda. Atacada pelos portugueses  ela se refugiou nas ilhas do rio Kwanza e nos anos 1626-1627 se estabeleceu no reino de Matamba, onde passou a comandar grupos de guerreiros imbangalas e a liderar a guerra contra os portugueses no período que se estendeu de 1630 até 1656, quando aceitou a paz e se converteu pela segunda vez ao catolicismo.

No contexto da independência angolana frente aos portugueses, na segunda metade do século XX. Nzinga aparece como heroína nacional, personificação maior da luta anticolonial, sendo enaltecida em romances, poesias, no teatro e no cinema. A preservação de sua memória na tradição oral assumiu na Diáspora  caráter religioso e político, com forte conotação de resistência cultural.

Sua imagem foi preservada e transmitida nas irmandades de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos de Lisboa ou de diferentes partes do Brasil,  onde por vezes, as rainhas Gingas (ou Jingas) são ritualmente coroadas.  Tais celebrações ocorreram (e por vezes continuam a ocorrer) em Minas Gerais, Goiás, Bahia, Paraíba e Pernambuco – e sobretudo na comunidade quilombola de Morro Alto (Rio Grande do Sul), em que desde pelo menos o fim do século XIX as rainhas Gingas são anualmente coroadas, ao lado dos reis do Congo, durante a festa do Maçambique de Osório.

BIBLIOGRAFIA

MATA, Inocência (Org.). Nzinga Mbandi: história, memória e mito. Lisboa: Edições Colibri, 2012

PANTOJA, Selma.  Nzinga Mbandi: mulher, guerra e escravidão. Brasilia: Editora Thesaurus, 2000.

PANTOJA, Selma. “Nzinga a Mbandi”. In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (dir). Dictionary of African Biography. Oxford University Press, 2012, v. 4, p. 527-528.

PARREIRA, Adriano. Economia e sociedade em Angola na época da Rainha Jinga. Lisboa: Editorial Estampa, 1990.

PANTOJA, Selma. Jinga de Angola: a rainha guerreira da África. São Paulo: Todavia Editora, 2019.

Ancestrais

Ardi (4.400.000 anos)

Réplica de crânio reconstituído de Ardipithecus Ramidus
Fonte da imagem: Wikimedia Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Ardipithecus_ramidus.jpg. Acesso em: 11 de dez. de 2020.

Nome pelo qual ficou conhecido o fóssil fêmea denominado cientificamente como Ardipithecus ramidus, encontrado no ano de 1992 por uma equipe internacional de cientistas financiada pela Universidade da California em Aramis, no Deserto de Afar, na atual Etiópia. Após rigorosos estudos para determinar a autenticidade e originalidade da descoberta, a divulgação dos resultados foi anunciada em artigos da revista científica Nature no ano de 2009, e em um longo documentário exibido mundialmente no Discovery Channel.

O esqueleto, constituído de 125 partes, algumas das quais, como a cabeça, as mãos e os pés em bom estado de conservação, foi cuidadosamente escavado e reconstruído por uma equipe internacional de especialistas sob a supervisão de Tim White, que trabalha com paleontologia e arqueologia paleolítica.

Ardi teria medido 1,2 m de altura e pesava cerca de 55 quilos. A estrutura e composição física indicam que se tratava de um hominídeo fêmea. No estado atual das pesquisas, seu fóssil é considerado o mais antigo registro da evolução que levou ao aparecimento do gênero humano. A fêmea Ardipithecus era uma criatura das florestas, com cérebro pequeno, braços longos e pernas curtas. A pélvis e os pés mostram uma forma primitiva de caminhar ereto, porém ela também era capaz de subir em árvores, com seus longos e grandes dedos que lhe permitiam agarrar, assim como os primatas.

Sua descoberta confirma o que o acúmulo de pesquisas de diversas procedências demonstrou acerca da origem africana de todo o processo de constituição da humanidade. O nome do fóssil, Ardi, na língua etíope falada em Afar, significa, literalmente “Chão da Terra” ou “Origem” e, por extensão, “Ancestral”.  A palavra pithecus, acrescentada pelos cientistas, é de origem grega e traduz-se por “macaco” – em referência ao estudo dos primatas e hominídeos.

BIBLIOGRAFIA

GIBBONS, Ann. A new kind of ancestor: Ardipithecus unveiled. Science, v. 326, p. 36-40, 2009.

CLARCK, Gary; HENNEBERG, Maciej. The life history of Ardipithecus ramidus: a heterochronic modelo f sexual and social maturation. Anthropological Review, v. 78, n. 2, 2015: https://content.sciendo.com/view/journals/anre/78/2/article-p109.xml

Eva Africana (c. 200.000 anos)

Eva na igreja de Abreha e Atsbeha | Foto: Bernard Gagnon
Fonte da imagem: Wikimedia Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Abreha_and_Atsbeha_Church_-_Adam_and_Eve_01.jpg. Acesso em: 11 de dez. de 2020.

Mais recente ancestral comum, também conhecida como Eva Mitocondrial, nome proposto pela geneticista Rebecca L. Cann, quando ela e seus colegas pesquisadores da Universidade da California identificaram e dataram o vínculo de descendência do ser humano anatomicamente moderno com uma hipotética e única “mãe africana”,  a partir de análise de variação genética do  DNA mitocondrial (1987).

Usando DNA mitocondrial (herdado somente da linha materna), Rebecca Cann e seus associados examinaram 147 indivíduos e produziram uma árvore genética evolucionária mostrando os ramos de dois conjuntos de indivíduos: um conjunto de ancestral africano e um segundo conjunto de uma mistura entre africanos e “outros” ancestrais. A árvore revelou que os seres humanos modernos se originaram na África a partir de uma única fonte, que Cann e seus colegas nomearam “Eva”, de um período entre 140,000 e 290,000 anos atrás.  Pesquisas subsequentes situaram essa data em aproximadamente 200,000 anos atrás ao comparar dez modelos genéticos humanos.

“Eva Africana” é um modelo matemático, e não um fóssil real de restos humanos. Não obstante, a maioria dos cientistas atuais concordam que ela é ancestral de todos os seres humanos atuais e que viveu na África. Na primeira metade dos anos 1990 várias árvores alternativas foram publicadas, com várias “raízes” diferentes fora da África. Conforme o conhecimento em genética aumentava e as técnicas melhoravam, abordagens diferentes foram aplicadas ao problema das origens humanas, padrões de migração e tempo, e a presença ou ausência de gargalos genéticos (períodos durante os quais populações decrescem marcadamente em tamanho).

Em 2000, Kaessman  Ingman e U. Gyllesten sequenciaram completamente o DNA mitocondrial de 53 mulheres. Eles encontraram uma sequência distinta e única em cada uma dessas mulheres e foram hábeis em construir uma árvore genética baseada nesses dados. A primeira divergência ocorreu com mulheres da África Sub-Sahariana, seguidas por uma ramificação de vários indivíduos de outras partes da África, apoiando, deste modo, a origem genética africana dos humanos modernos proposta por Cann e seus colegas em 1987.

Um adicional de 66 mulheres foram sequenciadas independentemente por J.L. Elson e seus colegas (2001) com resultados similares. A Eva Africana não foi a única mulher de sua espécie. Muitos estudos de DNA nuclear, de fósseis e de sítios arqueológicos indicam uma população antiga nas dezenas de milhares na época que Eva estava viva. A dificuldade na interpretação provavelmente vem do fato de que, embora os estudos indiquem um único ancestral comum feminino para todas as mulheres vivas atualmente, estes estudos não levam em conta as linhas que desapareceram e o fato de os machos não passarem DNA mitocondrial.

 “Eva” não é a ancestral comum mais recente compartilhada por todos os humanos vivos; em vez disso, a proposta é que ela seria a provável ancestral comum matrilinear mais recente. Em meados dos anos 1990 geneticistas começaram a pesquisar o ancestral patrilinear mais comum dos humanos modernos, agora chamado “Adão cromossomial-Y” para se juntar a “Eva Africana” na linha evolucionária humana. Este teria vivido entre 60.000 e 90.000 anos na África subsaariana, segundo se pode aferir a partir dos dados obtidos até agora.

Wikimedia Commons. [Sítio institucional]. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Abreha_and_Atsbeha_Church_-_Adam_and_Eve_01.jpg. Acesso em: 11 dez. 2020.

BIBLIOGRAFIA

CANN, Rebecca L. Stoneking, M.; WILSON, A. C.. Mitocondrial DNA and human evolution. Nature, v. 325, p. 31-36, 1987.

CANN, Rebecca L.  Mothers, labels, and misogyny. In: HAGER, L. D. (Ed.). Women in human evolution. Londres: Routledge, 1997, p. 75–89.

DILLER, K. C; Cann Rebecca L. Molecular perspectives on human evolution. In: GIBSON, K. R.; TALLERMAN, M.  (Ed).  The Oxford handbook of language evolution. Nova Iorque: Oxford University Press, 2011.

INGMAN, M. et alii. Mitochondrial genome variation and the origin of modern humans. Nature, v. 408, p. 708-713, 2000.

MILLER, Elizabeth. African Eve”.  In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (dir). Dictionary of African Biography. Oxford University Press, 2012, v. 1, p. 107-108.

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